blog latest post

Entrevista a Vítor Paranhos Pereira: “O Grupo Semapa e Pedro Queiroz Pereira eram a mesma coisa"

Após mais de três décadas no Grupo Semapa, Vítor Paranhos Pereira prepara-se para uma nova etapa da sua vida. Aos 68 anos, o CFO do Grupo Semapa cessa as suas funções executivas na holding, mas permanece ligado à Sodim, continuando a acompanhar o Hotel Ritz – projeto que ajudou a desenvolver desde 1989. Desde esse primeiro dia,  Vítor Paranhos Pereira assistiu e participou na transformação da Semapa de uma holding familiar para um dos principais grupos empresariais portugueses. E foi também desde esse primeiro dia que Vítor Paranhos Pereira ensinou ao Grupo o valor da dedicação, determinação e de aceitar desafios.

Nesta entrevista, fala-nos do seu percurso ao longo de 36 anos, de como era trabalhar com Pedro Queiroz Pereira e do projeto que acompanhou de tão perto, o Ritz.

Como é que tudo começou?

O Pedro Queiroz Pereira tinha acabado de regressar do Brasil e houve uma decisão de dividir a gestão do património familiar entre ele e o Manuel Queiroz Pereira. Quando o Manuel começou a formar uma nova equipa, fui desafiado a integrar o Grupo. Assim, em 1989, iniciei funções na Sodim – SGPS, que então geria o Hotel Ritz e detinha uma participação no Hotel Sheraton.

Esteve sempre muito ligado ao Hotel Ritz. Qual foi o maior desafio?

Durante todos estes anos, a minha função foi acompanhar de perto a gestão local do Hotel Ritz e ter atenção às decisões de curto prazo que influenciavam o longo prazo.

A decisão de fechar o hotel durante a pandemia foi um grande desafio. Em 2019 tínhamos decidido renovar três pisos. Quando chegámos a março de 2020, a pergunta era ‘fechamos e aproveitamos este período para fazer mais mudanças?’ Foi uma decisão muito complicada porque ninguém sabia quanto tempo iria durar a pandemia, não iríamos ter rendimentos, havia muitas incertezas. Decidimos avançar e acabámos por renovar sete pisos em vez de três. Foi uma das decisões mais difíceis da minha carreira, mas resultou.

De que forma evoluiu o seu papel no Grupo Semapa ao longo dos anos?

Em 1993, com a doença do Manuel Queiroz Pereira, houve uma transferência da gestão para o Pedro Queiroz Pereira. Foi então que transitei para a equipa do Pedro. Se inicialmente tinha funções ligadas ao hotel, com o tempo passei também a integrar a área imobiliária do grupo. Mais tarde, em 2013, participei ativamente no processo de separação dos acionistas e passei a integrar o Conselho de Administração da Semapa como não executivo.

A mudança mais recente aconteceu em 2020, quando fui desafiado a assumir funções de CFO da Semapa. Comecei no dia um de março – quinze dias antes da pandemia.

Que desafios encontrou ao assumir o cargo de CFO em plena pandemia?

O Pedro Queiroz Pereira tinha falecido em 2018 e todos estávamos a aprender a trabalhar sem aquela figura de referência e a adaptarmo-nos a processos de governance e de relacionamento com as participadas sem essa figura central.

Havia uma filosofia do tempo do Pedro Queiroz Pereira em que a Semapa encarava as participadas como participadas financeiras. A pandemia obrigou-nos a criar uma relação mais próxima. Com a chegada de Ricardo Pires como CEO, em 2022, essa componente acentuou-se.

Em que medida?

Até final de 2022, um dos grandes desafios da Semapa era a questão da identidade. A Navigator tinha a sua identidade, a Secil a identidade dela, e assim sucessivamente. E havia uma certa dificuldade em perceber que havia um acionista comum. Este reconhecimento de que cada empresa tem a sua identidade, mas têm o chapéu comum do Grupo Semapa, foi um trabalho feito ao longo destes últimos três anos. A criação do “Making it Better” como propósito transversal foi algo conseguido neste último mandato.

Voltando um pouco atrás. Como era trabalhar com Pedro Queiroz Pereira?

Marcou-me definitivamente. Dos meus 36 anos aqui, três décadas foram com ele. Era uma pessoa com um pensamento estratégico fora do normal, delegava imenso, mas estávamos constantemente a ser desafiados. Se dizíamos “vou daqui até ali em dez minutos”, o Pedro Queiroz Pereira perguntava “porque é que não vais em oito?”. Foi uma pessoa que me ajudou muito em termos desenvolvimento pessoal. Aprendi imenso com ele. Foi marcante –  três décadas da minha vida profissional a trabalhar com ele, não podia deixar de marcar.

Meses antes de falecer, o Pedro Queiroz Pereira disse-me: ´”Vítor, já viu o que nós éramos quando nos sentámos aqui pela primeira vez e o que somos hoje.” Disse “nós”, não ‘eu’. Se me reconhecerem como alguém que contribuiu para esse sucesso, fico muito contente.

Como foi, para o Grupo Semapa, perder essa figura de referência?

O Grupo Semapa e Pedro Queiroz Pereira eram a mesma coisa. Por isso, foi um processo de grande adaptação. As filhas do Pedro Queiroz Pereira assumiram então a função acionista. Se juntarmos as três irmãs, temos a personalidade do pai – todas têm um bocadinho dele. Sempre sentimos uma grande confiança da parte delas e um apoio muito forte.

Como vê o futuro da Semapa?

Está a ser definida uma estratégia de crescimento – ser um Grupo maior, mais diversificado, que consiga crescer e concretizar os objetivos de chegar aos mil milhões de euros de EBITDA em 2030. Acho perfeitamente possível, é uma boa ambição. Já não vou contribuir ativamente, mas acompanharei sempre.

Quais são os seus planos após deixar as funções executivas na Semapa?

Comecei a planear o meu phase out há um ano. Aos 68 anos, chegou a altura de dar lugar aos mais novos. Fui convidado pelas acionistas a permanecer ligado à Sodim e acompanhar o Ritz por mais dois ou três anos, o que aceitei com gosto.

Agora, o objetivo é ser dono do meu tempo. Durante trinta e seis anos, a minha prioridade foi o Grupo Semapa.

Que legado gostaria de deixar na Semapa?

Gostaria de ser reconhecido como alguém que chegou em 1989 a um Grupo muito diferente do que existe hoje. Atualmente, a Semapa é um dos principais grupos empresariais portugueses e gostava de pensar que tive alguma coisa a ver com isso.

Meses antes de falecer, o Pedro Queiroz Pereira disse-me: ´”Vítor, já viu o que nós éramos quando nos sentámos aqui pela primeira vez e o que somos hoje.” Disse “nós”, não ‘eu’. Se me reconhecerem como alguém que contribuiu para esse sucesso, fico muito contente.